Este livro de Eduardo Henrique Barbosa de Vasconcelos faz parte de um movimento de questionar e problematizar uma outra narrativa centro-periferia — ao nível nacional. Ele faz um esforço heroico de confrontar e desafiar a hegemonia do modelo que privilegia a história do sudeste brasileiro, especialmente do Rio de Janeiro e São Paulo. De certa maneira reproduzindo o padrão da historiografia do Atlântico Norte os historiadores brasileiros — principalmente formados nas grandes universidades cariocas e paulistas — se concentraram nas “origens” das ciências no Brasil nas principais cidades do Sudeste. Com sua famosa escola de medicina e longo período como capital colonial, a Bahia teve um papel importante, mas secundário nesta narrativa nacional. O resto do país foi relegado ao silêncio. A dominância deste preconceito regional tem sua lógica. Como os grandes centros europeus começando no século XVI, com suas universidades, academias e instituições científicas, as primeiras faculdades de medicina e engenharia, e os laboratórios científicos surgiram em Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. b2q4a
Ironicamente reproduzindo a descolonização da história da ciência no mundo, a expansão das universidades brasileiras está desmantelando o colonialismo interno historiográfico brasileiro. A pesquisa minuciosa e detalhada de Eduardo Vasconcelos faz uma intervenção importante na reorientação da história da ciência brasileira. Ele, e um grupo importante de outros historiadores brasileiros, estão desvelando e recuperando uma história ignorada e esquecida. No processo de recriar essa história ele ajuda a dar som aos silêncios da historiografia. O Nordeste brasileiro, tantas vezes na historiografia e na opinião pública, se associa com a seca, a pobreza e os coronéis e não com a ciência e a medicina. Este livro faz um grande esforço para acabar com o silêncio e esquecimento historiográfico sobre a história da ciência e da medicina no Ceará.
Eduardo resgata o percurso científico de Joaquim Antonio Alves Ribeiro com um esforço heróico de pesquisa e trabalho de detetive. Nascido na cidade de Icó no sul do Ceará (1830), formado em medicina na Harvard University (1853), o doutor Alves Ribeiro foi o primeiro médico na Santa Casa da Misericórdia em Fortaleza, criou seu próprio museu (o Gabinete de História Natural) que mais tarde foi o Museu Provincial do Ceará, fundou um jornal e fez experimentos importantes. Morreu muito jovem em 1875. Mas como o autor mostra este pioneiro na ciência e na medicina no Ceará foi “obliterado” da historiografia oficial. O caso do doutor Alves Ribeiro dá força a uma outra falha da historiografia da ciência brasileira — os silêncios sobre instituições e produção cientifica não “planejada, feita, desenvolvida e financiada por uma instituição cientifica validada pela burocracia política da sua época”.
Esta história do médico cearense Joaquim Antonio Alves Ribero em vez de ser um caso antiquário de história local é uma importante contribuição ao repensamento da historiografia brasileira sobre a ciência e a medicina. O autor situa esta biografia obliterada numa revisão erudita, crítica e exaustiva da história da ciência brasileira. Este livro sobre um cearense esquecido é um bom o à reorientação da historiografia e da geografia da história da ciência brasileira.